Sempre odiei tudo que se faça on-line. Reuniões, aulas, conversas… tenho um profundo sentimento de desconexão em relação às pessoas quando me proponho a realizar alguma atividade nessa modalidade. Acredito que o motivo é porque possuo uma grande necessidade de socialização, então sempre utilizei os compromissos do dia a dia para me conectar com as pessoas. Sou de muitos amigos, estou sempre tomando um café da manhã com um, ou um drink com outro, isso faz parte da minha identidade. Essa é a forma que aprecio viver no mundo. Você pode imaginar que a pandemia foi um pesadelo para mim.
Após tornar-me psicólogo essa foi uma barreira digna de análise. Primeiramente, mantive a postura firme que minhas consultas seriam apenas presenciais; graças ao aluguel de consultórios por hora, seria possível atender cada dia da semana em um bairro, o que flexibilizaria a logística para pessoas de todos os cantos da cidade. Eu tinha o plano perfeito para não ter que lidar com o grande avanço da modernidade. O problema é que fui percebendo que por mais que existisse a possibilidade de uma consulta presencial próximo à residência, algumas pessoas simplesmente preferiam consultas on-line. Além do fato que começaram a aparecer muitas pessoas fora do país, fora do estado que gostariam de ser atendidas por mim. A frustação que senti me deu coragem para fazer as pazes com o atendimento on-line. Afinal, não existe remédio melhor para a frescura do que a impossibilidade.
Minha primeira paciente on-line foi Geórgia (Nome Fictício), ela morava em Portugal e através da indicação de uma amiga, tinha chegado até a minha clínica. Atrasei-me 5 minutos para a sessão porque apesar de ter feito todo o meu plano de iniciar a videochamada no momento correto, o aplicativo travou, é claro.
Geórgia era uma mulher atraente, com cabelos negros que pareciam recém cuidados por um estilista de classe. Estava em seus trinta e poucos anos e contradizendo a alegria de sua beleza, me recebeu com feições bem tristes. Apesar disso, ela parecia estar confortável em conversar por uma vídeo chamada, ao contrário de mim. Após as introduções iniciais e explicar um pouco a forma que eu trabalhava, perguntei como poderia ajudá-la. Ela foi direta:
G: Minha vida não anda, perdi a graça de viver, mal tenho vontade de sair da cama.
Y: Ok… e como você acha que a nossa relação terapêutica pode ajudar nisso?
G: Hum…. bom…. não sei. Acredito que possa me ajudar a sair disso e ser feliz.
Sempre presto muita atenção na queixa inicial trazida pelo paciente. Mesmo após meses de terapia, paciente e terapeuta começam a dar voltas no mesmo assunto porque esqueceram-se do que levou o paciente a procurá-lo. Voltar a primeira sessão depois de alguns meses é sempre muito valioso para o processo.
Inicialmente ela me trouxe muitas significantes, ¨minha vida¨, ¨graça de viver¨, ¨ser feliz¨. Em um estágio inicial como psicólogo eu estaria obcecado em saber o que significariam cada uma dessas significantes em seu mundo único pessoal. Contudo, a minha intuição clamava por outra coisa, eu queria fatos, cotidiano, queria saber exatamente o que era a vida dela naquele momento.
Y: Entendo… você poderia me dizer como vê a sua vida no momento? Bom, na verdade isso você já me disse, o que quero dizer é, como está a sua vida agora? Poderia me falar um pouco mais sobre isso? Gostaria de mergulhar nos fatos.
Amador. Como eu era patético me comunicando através de uma câmera, pensei.
Uma parte de sua história começou a ser contada, Geórgia cresceu em Minas Gerais, tendo estudado economia, tinha uma carreira promissora no mercado financeiro, trabalhava em um banco internacional do ramo e casou-se com Rodrigo, um professor universitário que lecionava Letras. Namoraram por dois anos e depois veio o pedido de casamento. Eram jovens bem-sucedidos, apaixonados e com uma vida pela frente, segundo ela. A sensação que tive foi que ela estava direcionando a história para falar desse relacionamento porque era a única coisa que importava. Minha intuição gritava que grande parte do problema residia ali. Ela continuou dizendo que Rodrigo havia recebido uma bolsa para realizar um pós-doutorado em Porto, e isso fazia parte de seu sonho. O que era só felicidade se transformou em uma confusão temporária, medo, insegurança, mudança de planos tornaram-se rotina na dinâmica do casal. Não sabiam o que fazer com a possibilidade de escolhas que se apresentavam e equilibrar isso com a relação que tinham e gostavam muito. Geórgia não queria que a rotina do relacionamento mudasse, gostava muito de sua carreira, não estava disposta a desistir dela mas ao mesmo tempo queria que Rodrigo seguisse seus sonhos, sentia-se culpada por no fundo ter sentimentos contraditórios sobre essa situação. Explicou que a vida acabou sendo generosa com os dois, ao desabafar da situação com um dos sócios de sua empresa, que acabou tendo a amizade por sua grande competência e destaque, disse para ela que faria algumas ligações. No dia seguinte retornou dizendo que havia uma vaga para trabalho, no mesmo cargo que ela, também em Porto.
O que era treva virou luz, segundo Geórgia. A vida tinha dado uma chance para que continuassem a ter a mesma vida, só que agora com a possibilidade das realizações das expectativas dos dois. Rodrigo poderia realizar seu pós doutorado, Geórgia poderia seguir com a sua carreira e os dois poderiam continuar vivendo esse amor sem interrupções na rotina de casal que já estavam acostumados. Disse-me que não teria problemas em mudar de país já que a única coisa que segurava ela era a carreira.
G: Parentes e amigos eu vejo nas férias, são importantes para mim mas quem passa todas as dificuldades comigo é meu marido, então com ele estarei.
Ela falava com muito orgulho da sua postura nessa relação.
Y: E como foi essa transição?
G: Bom, como te contei, aconteceu o inimaginável, a vida tinha se adaptado aos nossos planos, era um presente. Tinha tudo para dar certo, não?
Y: Talvez… deu certo?
G: Não, nem um pouco.
Geórgia continuou contando que a transição foi muito desafiadora. A sua inserção na nova sede da empresa não foi bem recebida por colegas de equipe, ela também tinha dificuldade em decifrar os comportamentos da cultura portuguesa. Não sabia exatamente como se comportar naquele grupo.
G: Para completar a minha produtividade caiu muito porque não tinha disponível os mesmos recursos que tinha no brasil
Antes dela continuar sua fala a interrompi porque senti uma pontada na minha intuição.
Y: E quais recursos eram esses?
Essa foi o primeiro momento que a vi um pouco constrangida, não era possível ver pela câmera mas imaginei que nesse momento ela tinha cruzado as pernas, como quem tenta se encolher em um canto. Deus, porque criastes terapia on-line?
G: Bom….. hum….. posso te contar mas não gostaria de ser julgada sobre… nunca contei isso para ninguém.
Y: Aqui não existem julgamentos, Geórgia, além de eu respeitar seu momento de me contar as coisas, pode ficar a vontade.
G: Nós usávamos drogas para trabalhar no banco
Y: Ah sim, ok.
Após ter percebido que aquele tema não me assustava ou causava espanto, tomou mais coragem.
G: Bom, na verdade, era uma grande cultura. As drogas eram servidas pelas chefias para os funcionários em qualquer momento. Ninguém era obrigado a usar nada, claro. Porém depois de um tempo nesse ambiente, digo, em alguns tempos passávamos madrugadas no banco, em épocas de fusões ou aquisições de grandes empresas… e bom… sempre me atraiu muito a competição, não queria ficar para trás.
Y: Então você começou a usar para não ter um desempenho inferior aos seus colegas.
G: Isso, perfeito.
Se eu não a interrompesse, iriamos passar batidos desse fato, danadinha. Antes que eu pudesse falar algo, ela se antecipou:
G: Cocaína na maioria das vezes. É impressionante o que ela faz com a sua dopamina, sabia? Em momentos de cansaço e desconcentração, tornava-me uma pessoa com um desempenho absoluto, uma grande confiança, também. Eles também nos ensinavam estratégias para não nos perdermos nisso, sabe? Era algo muito bem pensado e inteligente. Se você utilizasse, não poderia perder nenhuma refeição e havia um acompanhamento para saber se você tinha consumido água o suficiente. Também te ensinavam a como não deixar perceber que você usou a droga e a chegar em casa sóbrio para não ter problemas com familiares.
Eu sabia que o ambiente de mercado financeiro envolvia esse tipo de prática, mas não fazia ideia que era tão bem organizado, para mim as pessoas continuavam cheirando escondido nas cabines de banheiro como sempre fizeram.
G: Então quando se exagerava na dose, usávamos Key para relaxar um pouco, sabe o que é Key? Na verdade o nome original é Ketamina, é um anestésico de cavalos.
Um fato engraçado é que a mistura de Cocaína com Ketamina recebe o apelido de Calvin Klein, pensei.
G: A gente chamava de Calvin Klein, é a mistura de Coca com Key – Contou-me rindo.
Wow. Ela estava lendo os meus pensamentos?
Y: Entendo, e você não tinha nenhum desses, que você chama de recursos na nova sede?
G: Não! Nada! Eram todos uns sóbrios filhos da puta. Acredita?
Essa era a primeira emoção que experimentava na terapia, raiva. Estava feliz por ela estar se abrindo tanto em um primeiro encontro.
G: Bom, e você pode adivinhar o que aconteceu depois.
Y: Posso?
G: Meu desempenho caiu, fiquei desmotivada e a equipe me sabotou. Fui demitida no terceiro mês.
Y: Entendo. Imagino também que a apatia causada pela ausência da cocaína tenha um papel nisso.
G: Sim, exatamente! Essa era a palavra, eu estava apática. Só agora parei para pensar que o meu estado no momento pode ser consequência desse uso constante nos últimos anos.
Eu não queria isso, nesse momento minha intuição gritava para outra direção, pode ter sido um erro ter entrado um pouco no assunto da droga. Posso sem querer ter dado uma justificativa para que ela permanecesse no estado não quer mais estar, pensei. Ela não queria ter entrado nesse assunto, eu forcei isso. Bom, nada que não possamos consertar. Fui honesto:
Y: Sim, pode ser. Agradeço por ter me compartilhado. Mas também Geórgia, não sei se aprofundar nisso pode nos levar a uma direção positiva, quando me fala dessa transição sinto que existe uma dor mais profunda aí. Me corrija se eu estiver enganado, por favor.
G: Sim, é verdade, essa questão do trabalho foi o menor dos problemas. A separação foi o que me desconcertou.
Y: Ok, gostaria de falar mais sobre isso?
Lágrimas escorreram pelo seu rosto, ali estava uma tristeza profunda. Ela as enxugava com um pano.
G: Bom, sabe, doutor…
Y: Apenas Yuri está ótimo, Geórgia.
Ela sorriu mediante ao choro e prosseguiu.
G: Eu fiz tudo certo, fui uma esposa parceira, compreensível, presente.
Como ela era presente se trabalhava madrugadas no banco? Pensei.
G: E para ser honesta não sei o que se passou… fomos perdendo o diálogo, depois só discutíamos e um belo dia me comunicou o fim do relacionamento e saiu de casa.
Esse término acarretava uma dor profunda, nossa primeira sessão encerrou-se com Geórgia demonstrando seus sentimentos atuais em relação a Rodrigo. No fundo o culpava pela sua vida não andar. Se não tivesse saído do Brasil, ainda teria seu emprego, sua vida, sua felicidade. E agora estava em um outro país, sem perspectiva, sem marido, sem carreira. Ele era o perfeito vilão.
Eu estava bem impressionado com a primeira sessão de Geórgia, ela não tinha muito pudor em se abrir e dizer o que sentia, estava muito otimista com o nosso trabalho juntos e havia simpatizado bastante por ela, o que durou pouco.
Não sei dizer ao certo quando entramos em uma aspiral de culpa e mágoa em nossas sessões. Ela havia descoberto que Rodrigo havia engatado em um novo relacionamento e criou uma conta anônima no Instagram para acompanhar o romance dos dois. Iniciou-se em um padrão de comparação com a sua nova namorada, dizia que ele sempre teve preferência para loiras e culpava-se por ser morena. Dizia, dentre outras coisas, que se o problema era aquele teria pintado o cabelo sem problemas. Nada que eu tentava elaborar fazia efeito, além disso ela tentava engrenar-se novamente em sua carreira e não estava dando certo e culpava-se por isso ainda mais, usava o termo procrastinação com muita frequência e me parece que a sua vida tornou-se um estabelecer de metas que não conseguia cumprir. Existia em função disso. Até conseguiu retornar a trabalhar na modalidade on-line para um banco do Brasil. Começou a comprar drogas com um traficante local para tentar imitar a vida que tinha no Brasil e ter os resultados esperados. Também não deu certo, foi demitida meses depois. A sua vida estava trancada, nada se movimentava, segundo ela. Estava em outro país, sem fonte de renda, divorciada, sozinha e recebendo dinheiro dos pais que haviam dado um aviso final que não iriam mais conseguir custear sua vida em Portugal. Ela precisava solucionar a sua vida rápido e por isso me procurou.
Eu sabia que uma hora ou outra toda aquela frustação e mágoa seria transferida para mim e isso estava dentro do esperado, como também o comportamento dela em relação ao término. Só que isso era uma ilusão da minha parte, porque fiz uma presunção falsa e deixei passar uma informação muito importante. Um dia em mais uma sessão de mágoas e frustações onde eu não tinha espaço nem para falar direito, decidi averiguar:
Y: Geórgia, desculpe te interromper. Há quanto tempo você e Rodrigo se separaram?
G: 5 anos.
Porra.
Me senti um idiota, eu estava me comportando como se estivesse diante de um processo rotineiro de término. Não que eu tenha que determinar o tempo de cada um de superação de seus conflitos, mas naquela hora ficou claro para mim que existia uma questão muito maior.
Nossa relação começou a declinar, eu me sentia invisível nas sessões e parece que Geórgia usava a terapia apenas para ter alguém na plateia para assistir suas reclamações de como a vida não estava certa e que era injusta, além de Rodrigo ser um canalha. Então, a transferência começou, ela estava completamente insatisfeita comigo e com a terapia.
Ela foi bem rude, disse que havia jogado todo seu dinheiro fora em nossas sessões (4 até o momento), e que eu não havia oferecido nenhum resultado para que a vida dela melhorasse nem um pouco. Disse que estava completamente decepcionada com o meu trabalho e que ia cobrar sua amiga pela indicação que não deveria ter feito. Eu não sabia o que dizer, no fundo também me sentia um incompetente e talvez por isso fiquei em silêncio.
Ao final da sessão não sabia o que sentir, sentia raiva da Geórgia por ser rude, frustração por sentir que a terapia não estava caminhando, medo por ter minha reputação afetada por seus comentários. Eu não fazia a mínima ideia do que fazer para ajudá-la, em um determinado ponto me vi oferecendo soluções para sua vida, todas infrutíferas. Nós psicólogos não devemos fazer isso porque os pacientes sabem o que tem que fazer, apenas não fazem. O porquê disso é o verdadeiro objeto da terapia. Eu havia gostado muito da Geórgia no início e agora nossos encontros me faziam sentir uma angústia muito profunda… tudo isso em um mês. Eu precisava de supervisão.
Viajei para fora do país no objetivo de me reunir com o meu mentor, ele havia se mudado para Winsconsin quando aceitou o convite para ensinar psicologia em uma Universidade renomada. Ele tinha ganhado muita fama nos últimos anos, por ser um psicólogo genial e um professor excelente. Temos uma amizade de anos que cultivávamos com muito amor e de vez em quando nos reuníamos em sua casa para uma xícara de café e com o objetivo de colocar os assuntos em dia e claro, para supervisão.
Supervisão é quando o psicólogo leva o caso para um profissional mais experiente e recebe orientações sobre ele. Isso tem que ser feito com frequência não por causa da incompetência do profissional, mas sim para ter um outro ponto de vista do caso, já que o supervisor está fora da situação, consegue ter uma visão mais ampla e enxergar o que não está aparente no momento.
Ele me esperava na varanda de sua casa, estava frio e nevando. Após sacudir minhas botas em sua escada de madeira na entrada, trocamos um abraço forte, acendeu um cigarro e começamos a conversar, ele sempre fazia isso quando queria puxar ideias profundas. Ofereceu-me um cigarro. Não tenho o hábito de fumar, mas gostava de apreciar um cigarro com ele, sentia que era uma atividade que fazíamos juntos e que ficávamos mais conectados.
Despejei todas as minhas queixas em relação a esse caso, toda a história de Geórgia, minhas frustrações e tudo que sentia em relação a ela, disse que estava pronto para largar esse caso por estar me fazendo mal. Ele mirou-me com um olhar específico e misterioso, acredito vir de um raciocínio de quem possui 50 anos de experiência em psicologia clínica. Talvez um dia eu descubra.
Após acender mais um cigarro disse:
– Chama-se transferência, gênio
Ele fazia isso com frequência, me trazia termos que ele já tinha me ensinado para me levar a alguma provocação positiva. Antes que eu pudesse me defender, me cortou:
– Você tem tentado entender ela pelo ponto de vista dela, tem uma boa habilidade em se colocar no lugar do paciente. Mas já tentou se colocar no lugar desse Rodrigo? Por que acha que ele vazou? Quer dizer, ele pareceu apaixonado o suficiente para pedi-la em casamento. Me chama atenção também você ter a dificuldade de perceber a real questão da Geórgia, nunca vi você passar por isso, talvez exista uma similaridade entre a questão dela e a sua.
Eu estava mais confuso do que nunca, ele prosseguiu:
– E que bosta de escavação arqueológica é essa que vocês tem tentado fazer? De novo com essa besteira freudiana? O que cura é a relação, já te disse isso muitas vezes. Percebe o que a relação de vocês está dizendo?
– Não, nem um pouco
– Bom, você tem duas bolas e um cano de baixo dessa cueca, não?
– Sim
– Então você é um homem.
– Até o momento.. – tenho o hábito de ser engraçadinho quando estou tomando esporro
– E ela é uma mulher.
– E? – Eu sabia onde ele estava querendo chegar, me senti tolo por não ter visto antes
– Isso significa que ela irá projetar em você a figura do que é o homem na vida dela. Tudo que você está sentindo nesse momento por ela é também o que o Rodrigo sentiu, perceba que ele vazou e agora você quer vazar também, não? Quer dizer, ela está completamente sozinha, foi deixada pelo ex-marido e a única pessoa que ela tem, seu psicólogo, agora quer deixá-la também. Meus parabéns.
– Bom, eu discordo um pouco, eu me encantei muito pela pessoa que ela era no início, mas depois ela mudou muito.
– Exato, nesses primeiros encontros ela te mostra quem ela era no Brasil, isso que apaixonou o Rodrigo. Algo deixou de existir nessa transição para Portugal. Ela passou a existir de forma tão diferente que isso conseguiu matar tudo que o Rodrigo sentia a ponto de conseguir passar por cima da culpa de abandonar uma esposa que ele mesmo levou para outro país.
– Ok, e o que foi isso que mudou nela?
– Agora eu faço o seu trabalho por você, Yuri? Pense. Essa transição é a chave.
Rimos enquanto acabávamos os cigarros. Ele passou a mão na minha cabeça com a aspereza de quem faz carinho em um vira-lata e disse com ternura:
– Agora vá, tenho coisas pra fazer. Você é um bom psicólogo, não se preocupe. Eu não toleraria o meu fracasso pessoal de você ter se tornado um mau profissional. – E saiu rindo.
Procurei o bar mais próximo para um copo de whisky, eu precisava sentar sozinho em um bar para clarear as minhas ideias. Tinha muito o que pensar, a autoimagem de Geórgia, em como ela se apresentava para o mundo, sua identidade e essência que havia sido apresentada era completamente diferente da que existia no Brasil, existiu uma grande mudança aí que eu queria decifrar. Similaridade comigo mesmo? O que será que o T. queria dizer com isso? Claro que ele já havia decifrado tudo isso em 5 segundos, mas gostava que eu andasse com as minhas próprias pernas. Estava perdido em minhas ideias quando ouvi uma mulher falando em português no telefone perto de mim. Chamou-me atenção, afinal eu estava nos Estados Unidos e acabei ouvindo um pouco a conversa. Ela estava falando com uma amiga sua experiência em morar fora do país e disse estar passando pela solidão do imigrante.
Era a peça que faltava, eu havia entendido o caso. Quando Geórgia disse que nada a segurava em ir para Portugal e disse ¨família e amigos vemos nas férias¨ eu interpretei como se isso não fosse muita coisa para ela, mas sim, era. Ela estava tentando tornar menor grande preço que ela estava pagando para ir para outro país, também na expectativa de criar um ciclo de amizades e contatos, mas não se deu bem com os portugueses. Ela conhecia muitas pessoas em Minas e estava sempre com gente, era a pessoa na mesa do bar que todos paravam para escutar alguma história, apreciava muitíssimo essa admiração pública. Imagino que isso somado a sua confiança, autenticidade e independência a tornava uma pessoa muito interessante. Rodrigo deveria pensar o mesmo. Talvez ela não soubesse que estar com pessoas e ter a sua própria rede de contatos era algo tão importante para sua identidade. Primeiro existimos e só depois somos, a existência precede a essência, ser é agir e o agir é sempre social, precisamos do outro para manifestar a nossa essência e parte da essência de Geórgia era ser uma pessoa pública. Na incompreensão de si mesma não mediu os riscos da solidão e não sabia como lidar com ela, toda vez que a solidão a apertava, tentava preencher o buraco com Rodrigo, que jamais conseguiria suprir esse vazio. Com o tempo tornou-se uma sofredora, reclamona e exigente. Rodrigo não aguentou. Daí, vem a culpa. A culpa é quando o projeto original de quem somos não consegue se manifestar no mundo. Quando esse vir-a-ser é, de alguma forma, bloqueado e a essência não consegue se manifestar, sentimos culpa — intensificada pela angústia que a liberdade carrega. Somos livres para ser quem quisermos, mas apenas dentro dos limites das nossas próprias possibilidades. E, ao perceber esses limites, é como se escolhêssemos não ser aquilo que desejamos ser. Isso angustia. Mas o que define essas possibilidades? A nossa consciência. No caso de Geórgia, havia muitas formas dela se tornar quem realmente era e expressar sua essência — só que sua consciência ainda não alcançava essas possibilidades. Na primeira consulta, ela dizia querer ser feliz. Mas, afinal, qual era a razão para que se sentisse feliz? A felicidade é uma escolha? Sim, mas toda escolha exige uma possibilidade real de ser concretizada. E naquele momento, por não compreender as verdadeiras raízes do seu sofrimento, Geórgia não tinha nem essa possibilidade, muito menos a liberdade.
Esses insights sobre o caso me deixaram menos angustiado. Agora eu via alguma luz no fim do túnel. Porém, eu tinha avançado apenas nas minhas percepções, e não na minha relação com Geórgia, ainda precisava caminhar junto com ela para alguma mudança.
Percebi também que parte da obsessão de Geórgia por Rodrigo era porque ele nunca deu a motivação real que o fez ir embora, acredito que não teve a coragem de dizer como ela realmente fazia-o se sentir, então, como a transferência já estava feita, tomei a iniciativa dela receber o feedback de como ela fazia eu me sentir antes que ela começasse em suas lamentações:
Y: Geórgia, hoje iremos fazer diferente, irei compartilhar com você como eu me sinto na nossa relação e gostaria que você me escutasse.
Y: Sinto-me invisível aqui na maior parte do tempo, primeiro decepcionado, e depois frustrado. Tive um grande encanto pela sua personalidade no início, porém existiu uma mudança do seu jeito de ser de uma hora para outra, o que apresentou-se como uma mulher madura, interessante misteriosa virou uma menina mimada, reclamona e pessimista. Na maioria de nossas conversas eu sinto que não existo, o que existe é você e um ciclo de lamentações. Me sinto frustrado com isso porque gostaria de avançar nas nossas conversas, porém parece que não conseguimos sair disso. Isso tudo me deu vontade de parar de dar terapia para você, eu vejo hoje que me sinto como o Rodrigo sentia-se ao seu lado em Portugal, a vontade de ir embora. Porém, não quero fazer isso. Você acha que conseguiu decifrar porque ele tomou essa decisão?
Eu tinha confiado na técnica do Rogers e sido completamente honesto sobre os meus sentimentos, não sabia o resultado que isso traria, porém não vi outro caminho. Ela mostrou-se um pouco chocada com todas as minhas afirmações, ficamos em silêncio por um tempo.
G: Eu não sei direito o motivo, nunca soube, ele nunca me disse. O que arrasa é esse sentimento rasante que ficou com a ida dele.
Y: Esse sentimento foi causado pela ida dele, ou ele sempre esteve aí e o Rodrigo fazia com que ele não estava aparente
G: Eu acho que….. não sei….. ficou mais intenso depois que ele foi embora
Y: Então sempre existiu..
G: Não percebia ele no Brasil, foi mais uma coisa daqui
Y: Ok. Não tenho a certeza se existia antes, mas comecei a perceber esse sentimento em portugal
G: Isso.
Y: Conseguimos nomear esse sentimento?
G: Não tem um nome exato… é como se eu não existisse.
Y: E o que te faria existir?
G: Ser vista, é claro.
Y: E você não era?
G: Não
Silêncio
G: Quer dizer, depois de um dado momento, apenas pelo Rodrigo.
Y: E era suficiente
G: Não, nenhum pouco
Y: Entendo, e o que você fazia com esse sentimento de insuficiência?
G: Nada.. nada verdade eu tentava ser mais vista por ele ainda.
Y: É como se ele estivesse tentando suprir sozinho a força de uma represa.
G: Sim.
Y: Geórgia, você percebe o que é esse ¨ser vista¨que você está me falando? A magnitude disso para o seu processo de identidade? Você sempre foi uma pessoa popular no Brasil, tinha admiração, atenção. Isso faz parte da sua identidade. Um grande medo para pessoas assim é a solidão. Eu tive dificuldade de perceber isso no início porque também é meu maior medo. Fujo até da ideia de me sentir assim em mim, e pelo visto fugi de enxergar em você também.
G: Eu…. eu não tinha parado para pensar, realmente faz sentido. O que mais o culpo não foi pelo fato de me deixar, e sim pelo fato de eu estar sozinha agora.
Y: Por isso seria muito difícil superar, as consequências que foram escolhidas estão presentes no momento e não são apenas uma mágoa do passado.
G: Isso, perfeito
Y: Contudo, você escolhe diariamente continuar sozinha, não existe problema nenhum em ter essa necessidade. Você construiu-se dessa forma. Pode escolher se construir de outra maneira, mas é necessário processar isso antes. Esse peso de não conseguir exercer a sua própria identidade gera o que em você?
G: Uma angústia esmagadora
Foi uma sessão bem intensa e eu estava bem satisfeito com o diálogo, aguardei ansiosamente por Geórgia para continuarmos nosso trabalho na semana seguinte. Ela não atendeu o telefone. Na semana seguinte também não. Ficamos 28 dias sem nos ver.
Certo dia enviou-me uma mensagem dizendo que estava pronta para retornar o processo terapêutico e de certa forma fiquei feliz com aquilo. Quando nos reunimos on-line ela estava visivelmente diferente, ela brilhava. Sua pele estava em um tom diferente, sorria, atendeu a ligação em uma cafeteria bem elegante. Era outra pessoa.
Pediu-me desculpas pela ausência, disse estar passando por um momento introspectivo e que tinha concatenado muitas questões. Mostrava uma maturidade impar dizendo muitas coisas sobre ela em que eu havia pensado. Não só isso, entendeu que precisava se enturmar e tomou inúmeras soluções criativas para isso, matriculou-se em um curso de teatro, aulas de ballet e instalou um aplicativo de relacionamentos, já tinha tido um encontro um homem que considerava bacana e que estava naquela cafeteria porque havia um encontro de amigas do teatro ali após a sessão, conversamos sobre todas essas mudanças e a parabenizei no final da sessão.
Na semana seguinte Geórgia avisou um dia antes que não aparecia mais para a terapia. Havia se dado alta. O motivo? Estava feliz.
Somos livres para sermos felizes?
Sempre odiei tudo que se faça on-line. Reuniões, aulas, conversas… tenho um profundo sentimento de desconexão em relação às pessoas quando me proponho a realizar alguma atividade nessa modalidade. Acredito que o motivo é porque possuo uma grande necessidade de socialização, então sempre utilizei os compromissos do dia a dia para me conectar com as pessoas. Sou de muitos amigos, estou sempre tomando um café da manhã com um, ou um drink com outro, isso faz parte da minha identidade. Essa é a forma que aprecio viver no mundo. Você pode imaginar que a pandemia foi um pesadelo para mim.
Após tornar-me psicólogo essa foi uma barreira digna de análise. Primeiramente, mantive a postura firme que minhas consultas seriam apenas presenciais; graças ao aluguel de consultórios por hora, seria possível atender cada dia da semana em um bairro, o que flexibilizaria a logística para pessoas de todos os cantos da cidade. Eu tinha o plano perfeito para não ter que lidar com o grande avanço da modernidade. O problema é que fui percebendo que por mais que existisse a possibilidade de uma consulta presencial próximo à residência, algumas pessoas simplesmente preferiam consultas on-line. Além do fato que começaram a aparecer muitas pessoas fora do país, fora do estado que gostariam de ser atendidas por mim. A frustação que senti me deu coragem para fazer as pazes com o atendimento on-line. Afinal, não existe remédio melhor para a frescura do que a impossibilidade.
Minha primeira paciente on-line foi Geórgia (Nome Fictício), ela morava em Portugal e através da indicação de uma amiga, tinha chegado até a minha clínica. Atrasei-me 5 minutos para a sessão porque apesar de ter feito todo o meu plano de iniciar a videochamada no momento correto, o aplicativo travou, é claro.
Geórgia era uma mulher atraente, com cabelos negros que pareciam recém cuidados por um estilista de classe. Estava em seus trinta e poucos anos e contradizendo a alegria de sua beleza, me recebeu com feições bem tristes. Apesar disso, ela parecia estar confortável em conversar por uma vídeo chamada, ao contrário de mim. Após as introduções iniciais e explicar um pouco a forma que eu trabalhava, perguntei como poderia ajudá-la. Ela foi direta:
G: Minha vida não anda, perdi a graça de viver, mal tenho vontade de sair da cama.
Y: Ok… e como você acha que a nossa relação terapêutica pode ajudar nisso?
G: Hum…. bom…. não sei. Acredito que possa me ajudar a sair disso e ser feliz.
Sempre presto muita atenção na queixa inicial trazida pelo paciente. Mesmo após meses de terapia, paciente e terapeuta começam a dar voltas no mesmo assunto porque esqueceram-se do que levou o paciente a procurá-lo. Voltar a primeira sessão depois de alguns meses é sempre muito valioso para o processo.
Inicialmente ela me trouxe muitas significantes, ¨minha vida¨, ¨graça de viver¨, ¨ser feliz¨. Em um estágio inicial como psicólogo eu estaria obcecado em saber o que significariam cada uma dessas significantes em seu mundo único pessoal. Contudo, a minha intuição clamava por outra coisa, eu queria fatos, cotidiano, queria saber exatamente o que era a vida dela naquele momento.
Y: Entendo… você poderia me dizer como vê a sua vida no momento? Bom, na verdade isso você já me disse, o que quero dizer é, como está a sua vida agora? Poderia me falar um pouco mais sobre isso? Gostaria de mergulhar nos fatos.
Amador. Como eu era patético me comunicando através de uma câmera, pensei.
Uma parte de sua história começou a ser contada, Geórgia cresceu em Minas Gerais, tendo estudado economia, tinha uma carreira promissora no mercado financeiro, trabalhava em um banco internacional do ramo e casou-se com Rodrigo, um professor universitário que lecionava Letras. Namoraram por dois anos e depois veio o pedido de casamento. Eram jovens bem-sucedidos, apaixonados e com uma vida pela frente, segundo ela. A sensação que tive foi que ela estava direcionando a história para falar desse relacionamento porque era a única coisa que importava. Minha intuição gritava que grande parte do problema residia ali. Ela continuou dizendo que Rodrigo havia recebido uma bolsa para realizar um pós-doutorado em Porto, e isso fazia parte de seu sonho. O que era só felicidade se transformou em uma confusão temporária, medo, insegurança, mudança de planos tornaram-se rotina na dinâmica do casal. Não sabiam o que fazer com a possibilidade de escolhas que se apresentavam e equilibrar isso com a relação que tinham e gostavam muito. Geórgia não queria que a rotina do relacionamento mudasse, gostava muito de sua carreira, não estava disposta a desistir dela mas ao mesmo tempo queria que Rodrigo seguisse seus sonhos, sentia-se culpada por no fundo ter sentimentos contraditórios sobre essa situação. Explicou que a vida acabou sendo generosa com os dois, ao desabafar da situação com um dos sócios de sua empresa, que acabou tendo a amizade por sua grande competência e destaque, disse para ela que faria algumas ligações. No dia seguinte retornou dizendo que havia uma vaga para trabalho, no mesmo cargo que ela, também em Porto.
O que era treva virou luz, segundo Geórgia. A vida tinha dado uma chance para que continuassem a ter a mesma vida, só que agora com a possibilidade das realizações das expectativas dos dois. Rodrigo poderia realizar seu pós doutorado, Geórgia poderia seguir com a sua carreira e os dois poderiam continuar vivendo esse amor sem interrupções na rotina de casal que já estavam acostumados. Disse-me que não teria problemas em mudar de país já que a única coisa que segurava ela era a carreira.
G: Parentes e amigos eu vejo nas férias, são importantes para mim mas quem passa todas as dificuldades comigo é meu marido, então com ele estarei.
Ela falava com muito orgulho da sua postura nessa relação.
Y: E como foi essa transição?
G: Bom, como te contei, aconteceu o inimaginável, a vida tinha se adaptado aos nossos planos, era um presente. Tinha tudo para dar certo, não?
Y: Talvez… deu certo?
G: Não, nem um pouco.
Geórgia continuou contando que a transição foi muito desafiadora. A sua inserção na nova sede da empresa não foi bem recebida por colegas de equipe, ela também tinha dificuldade em decifrar os comportamentos da cultura portuguesa. Não sabia exatamente como se comportar naquele grupo.
G: Para completar a minha produtividade caiu muito porque não tinha disponível os mesmos recursos que tinha no brasil
Antes dela continuar sua fala a interrompi porque senti uma pontada na minha intuição.
Y: E quais recursos eram esses?
Essa foi o primeiro momento que a vi um pouco constrangida, não era possível ver pela câmera mas imaginei que nesse momento ela tinha cruzado as pernas, como quem tenta se encolher em um canto. Deus, porque criastes terapia on-line?
G: Bom….. hum….. posso te contar mas não gostaria de ser julgada sobre… nunca contei isso para ninguém.
Y: Aqui não existem julgamentos, Geórgia, além de eu respeitar seu momento de me contar as coisas, pode ficar a vontade.
G: Nós usávamos drogas para trabalhar no banco
Y: Ah sim, ok.
Após ter percebido que aquele tema não me assustava ou causava espanto, tomou mais coragem.
G: Bom, na verdade, era uma grande cultura. As drogas eram servidas pelas chefias para os funcionários em qualquer momento. Ninguém era obrigado a usar nada, claro. Porém depois de um tempo nesse ambiente, digo, em alguns tempos passávamos madrugadas no banco, em épocas de fusões ou aquisições de grandes empresas… e bom… sempre me atraiu muito a competição, não queria ficar para trás.
Y: Então você começou a usar para não ter um desempenho inferior aos seus colegas.
G: Isso, perfeito.
Se eu não a interrompesse, iriamos passar batidos desse fato, danadinha. Antes que eu pudesse falar algo, ela se antecipou:
G: Cocaína na maioria das vezes. É impressionante o que ela faz com a sua dopamina, sabia? Em momentos de cansaço e desconcentração, tornava-me uma pessoa com um desempenho absoluto, uma grande confiança, também. Eles também nos ensinavam estratégias para não nos perdermos nisso, sabe? Era algo muito bem pensado e inteligente. Se você utilizasse, não poderia perder nenhuma refeição e havia um acompanhamento para saber se você tinha consumido água o suficiente. Também te ensinavam a como não deixar perceber que você usou a droga e a chegar em casa sóbrio para não ter problemas com familiares.
Eu sabia que o ambiente de mercado financeiro envolvia esse tipo de prática, mas não fazia ideia que era tão bem organizado, para mim as pessoas continuavam cheirando escondido nas cabines de banheiro como sempre fizeram.
G: Então quando se exagerava na dose, usávamos Key para relaxar um pouco, sabe o que é Key? Na verdade o nome original é Ketamina, é um anestésico de cavalos.
Um fato engraçado é que a mistura de Cocaína com Ketamina recebe o apelido de Calvin Klein, pensei.
G: A gente chamava de Calvin Klein, é a mistura de Coca com Key – Contou-me rindo.
Wow. Ela estava lendo os meus pensamentos?
Y: Entendo, e você não tinha nenhum desses, que você chama de recursos na nova sede?
G: Não! Nada! Eram todos uns sóbrios filhos da puta. Acredita?
Essa era a primeira emoção que experimentava na terapia, raiva. Estava feliz por ela estar se abrindo tanto em um primeiro encontro.
G: Bom, e você pode adivinhar o que aconteceu depois.
Y: Posso?
G: Meu desempenho caiu, fiquei desmotivada e a equipe me sabotou. Fui demitida no terceiro mês.
Y: Entendo. Imagino também que a apatia causada pela ausência da cocaína tenha um papel nisso.
G: Sim, exatamente! Essa era a palavra, eu estava apática. Só agora parei para pensar que o meu estado no momento pode ser consequência desse uso constante nos últimos anos.
Eu não queria isso, nesse momento minha intuição gritava para outra direção, pode ter sido um erro ter entrado um pouco no assunto da droga. Posso sem querer ter dado uma justificativa para que ela permanecesse no estado não quer mais estar, pensei. Ela não queria ter entrado nesse assunto, eu forcei isso. Bom, nada que não possamos consertar. Fui honesto:
Y: Sim, pode ser. Agradeço por ter me compartilhado. Mas também Geórgia, não sei se aprofundar nisso pode nos levar a uma direção positiva, quando me fala dessa transição sinto que existe uma dor mais profunda aí. Me corrija se eu estiver enganado, por favor.
G: Sim, é verdade, essa questão do trabalho foi o menor dos problemas. A separação foi o que me desconcertou.
Y: Ok, gostaria de falar mais sobre isso?
Lágrimas escorreram pelo seu rosto, ali estava uma tristeza profunda. Ela as enxugava com um pano.
G: Bom, sabe, doutor…
Y: Apenas Yuri está ótimo, Geórgia.
Ela sorriu mediante ao choro e prosseguiu.
G: Eu fiz tudo certo, fui uma esposa parceira, compreensível, presente.
Como ela era presente se trabalhava madrugadas no banco? Pensei.
G: E para ser honesta não sei o que se passou… fomos perdendo o diálogo, depois só discutíamos e um belo dia me comunicou o fim do relacionamento e saiu de casa.
Esse término acarretava uma dor profunda, nossa primeira sessão encerrou-se com Geórgia demonstrando seus sentimentos atuais em relação a Rodrigo. No fundo o culpava pela sua vida não andar. Se não tivesse saído do Brasil, ainda teria seu emprego, sua vida, sua felicidade. E agora estava em um outro país, sem perspectiva, sem marido, sem carreira. Ele era o perfeito vilão.
Eu estava bem impressionado com a primeira sessão de Geórgia, ela não tinha muito pudor em se abrir e dizer o que sentia, estava muito otimista com o nosso trabalho juntos e havia simpatizado bastante por ela, o que durou pouco.
Não sei dizer ao certo quando entramos em uma aspiral de culpa e mágoa em nossas sessões. Ela havia descoberto que Rodrigo havia engatado em um novo relacionamento e criou uma conta anônima no Instagram para acompanhar o romance dos dois. Iniciou-se em um padrão de comparação com a sua nova namorada, dizia que ele sempre teve preferência para loiras e culpava-se por ser morena. Dizia, dentre outras coisas, que se o problema era aquele teria pintado o cabelo sem problemas. Nada que eu tentava elaborar fazia efeito, além disso ela tentava engrenar-se novamente em sua carreira e não estava dando certo e culpava-se por isso ainda mais, usava o termo procrastinação com muita frequência e me parece que a sua vida tornou-se um estabelecer de metas que não conseguia cumprir. Existia em função disso. Até conseguiu retornar a trabalhar na modalidade on-line para um banco do Brasil. Começou a comprar drogas com um traficante local para tentar imitar a vida que tinha no Brasil e ter os resultados esperados. Também não deu certo, foi demitida meses depois. A sua vida estava trancada, nada se movimentava, segundo ela. Estava em outro país, sem fonte de renda, divorciada, sozinha e recebendo dinheiro dos pais que haviam dado um aviso final que não iriam mais conseguir custear sua vida em Portugal. Ela precisava solucionar a sua vida rápido e por isso me procurou.
Eu sabia que uma hora ou outra toda aquela frustação e mágoa seria transferida para mim e isso estava dentro do esperado, como também o comportamento dela em relação ao término. Só que isso era uma ilusão da minha parte, porque fiz uma presunção falsa e deixei passar uma informação muito importante. Um dia em mais uma sessão de mágoas e frustações onde eu não tinha espaço nem para falar direito, decidi averiguar:
Y: Geórgia, desculpe te interromper. Há quanto tempo você e Rodrigo se separaram?
G: 5 anos.
Porra.
Me senti um idiota, eu estava me comportando como se estivesse diante de um processo rotineiro de término. Não que eu tenha que determinar o tempo de cada um de superação de seus conflitos, mas naquela hora ficou claro para mim que existia uma questão muito maior.
Nossa relação começou a declinar, eu me sentia invisível nas sessões e parece que Geórgia usava a terapia apenas para ter alguém na plateia para assistir suas reclamações de como a vida não estava certa e que era injusta, além de Rodrigo ser um canalha. Então, a transferência começou, ela estava completamente insatisfeita comigo e com a terapia.
Ela foi bem rude, disse que havia jogado todo seu dinheiro fora em nossas sessões (4 até o momento), e que eu não havia oferecido nenhum resultado para que a vida dela melhorasse nem um pouco. Disse que estava completamente decepcionada com o meu trabalho e que ia cobrar sua amiga pela indicação que não deveria ter feito. Eu não sabia o que dizer, no fundo também me sentia um incompetente e talvez por isso fiquei em silêncio.
Ao final da sessão não sabia o que sentir, sentia raiva da Geórgia por ser rude, frustração por sentir que a terapia não estava caminhando, medo por ter minha reputação afetada por seus comentários. Eu não fazia a mínima ideia do que fazer para ajudá-la, em um determinado ponto me vi oferecendo soluções para sua vida, todas infrutíferas. Nós psicólogos não devemos fazer isso porque os pacientes sabem o que tem que fazer, apenas não fazem. O porquê disso é o verdadeiro objeto da terapia. Eu havia gostado muito da Geórgia no início e agora nossos encontros me faziam sentir uma angústia muito profunda… tudo isso em um mês. Eu precisava de supervisão.
Viajei para fora do país no objetivo de me reunir com o meu mentor, ele havia se mudado para Winsconsin quando aceitou o convite para ensinar psicologia em uma Universidade renomada. Ele tinha ganhado muita fama nos últimos anos, por ser um psicólogo genial e um professor excelente. Temos uma amizade de anos que cultivávamos com muito amor e de vez em quando nos reuníamos em sua casa para uma xícara de café e com o objetivo de colocar os assuntos em dia e claro, para supervisão.
Supervisão é quando o psicólogo leva o caso para um profissional mais experiente e recebe orientações sobre ele. Isso tem que ser feito com frequência não por causa da incompetência do profissional, mas sim para ter um outro ponto de vista do caso, já que o supervisor está fora da situação, consegue ter uma visão mais ampla e enxergar o que não está aparente no momento.
Ele me esperava na varanda de sua casa, estava frio e nevando. Após sacudir minhas botas em sua escada de madeira na entrada, trocamos um abraço forte, acendeu um cigarro e começamos a conversar, ele sempre fazia isso quando queria puxar ideias profundas. Ofereceu-me um cigarro. Não tenho o hábito de fumar, mas gostava de apreciar um cigarro com ele, sentia que era uma atividade que fazíamos juntos e que ficávamos mais conectados.
Despejei todas as minhas queixas em relação a esse caso, toda a história de Geórgia, minhas frustrações e tudo que sentia em relação a ela, disse que estava pronto para largar esse caso por estar me fazendo mal. Ele mirou-me com um olhar específico e misterioso, acredito vir de um raciocínio de quem possui 50 anos de experiência em psicologia clínica. Talvez um dia eu descubra.
Após acender mais um cigarro disse:
– Chama-se transferência, gênio
Ele fazia isso com frequência, me trazia termos que ele já tinha me ensinado para me levar a alguma provocação positiva. Antes que eu pudesse me defender, me cortou:
– Você tem tentado entender ela pelo ponto de vista dela, tem uma boa habilidade em se colocar no lugar do paciente. Mas já tentou se colocar no lugar desse Rodrigo? Por que acha que ele vazou? Quer dizer, ele pareceu apaixonado o suficiente para pedi-la em casamento. Me chama atenção também você ter a dificuldade de perceber a real questão da Geórgia, nunca vi você passar por isso, talvez exista uma similaridade entre a questão dela e a sua.
Eu estava mais confuso do que nunca, ele prosseguiu:
– E que bosta de escavação arqueológica é essa que vocês tem tentado fazer? De novo com essa besteira freudiana? O que cura é a relação, já te disse isso muitas vezes. Percebe o que a relação de vocês está dizendo?
– Não, nem um pouco
– Bom, você tem duas bolas e um cano de baixo dessa cueca, não?
– Sim
– Então você é um homem.
– Até o momento.. – tenho o hábito de ser engraçadinho quando estou tomando esporro
– E ela é uma mulher.
– E? – Eu sabia onde ele estava querendo chegar, me senti tolo por não ter visto antes
– Isso significa que ela irá projetar em você a figura do que é o homem na vida dela. Tudo que você está sentindo nesse momento por ela é também o que o Rodrigo sentiu, perceba que ele vazou e agora você quer vazar também, não? Quer dizer, ela está completamente sozinha, foi deixada pelo ex-marido e a única pessoa que ela tem, seu psicólogo, agora quer deixá-la também. Meus parabéns.
– Bom, eu discordo um pouco, eu me encantei muito pela pessoa que ela era no início, mas depois ela mudou muito.
– Exato, nesses primeiros encontros ela te mostra quem ela era no Brasil, isso que apaixonou o Rodrigo. Algo deixou de existir nessa transição para Portugal. Ela passou a existir de forma tão diferente que isso conseguiu matar tudo que o Rodrigo sentia a ponto de conseguir passar por cima da culpa de abandonar uma esposa que ele mesmo levou para outro país.
– Ok, e o que foi isso que mudou nela?
– Agora eu faço o seu trabalho por você, Yuri? Pense. Essa transição é a chave.
Rimos enquanto acabávamos os cigarros. Ele passou a mão na minha cabeça com a aspereza de quem faz carinho em um vira-lata e disse com ternura:
– Agora vá, tenho coisas pra fazer. Você é um bom psicólogo, não se preocupe. Eu não toleraria o meu fracasso pessoal de você ter se tornado um mau profissional. – E saiu rindo.
Procurei o bar mais próximo para um copo de whisky, eu precisava sentar sozinho em um bar para clarear as minhas ideias. Tinha muito o que pensar, a autoimagem de Geórgia, em como ela se apresentava para o mundo, sua identidade e essência que havia sido apresentada era completamente diferente da que existia no Brasil, existiu uma grande mudança aí que eu queria decifrar. Similaridade comigo mesmo? O que será que o T. queria dizer com isso? Claro que ele já havia decifrado tudo isso em 5 segundos, mas gostava que eu andasse com as minhas próprias pernas. Estava perdido em minhas ideias quando ouvi uma mulher falando em português no telefone perto de mim. Chamou-me atenção, afinal eu estava nos Estados Unidos e acabei ouvindo um pouco a conversa. Ela estava falando com uma amiga sua experiência em morar fora do país e disse estar passando pela solidão do imigrante.
Era a peça que faltava, eu havia entendido o caso. Quando Geórgia disse que nada a segurava em ir para Portugal e disse ¨família e amigos vemos nas férias¨ eu interpretei como se isso não fosse muita coisa para ela, mas sim, era. Ela estava tentando tornar menor grande preço que ela estava pagando para ir para outro país, também na expectativa de criar um ciclo de amizades e contatos, mas não se deu bem com os portugueses. Ela conhecia muitas pessoas em Minas e estava sempre com gente, era a pessoa na mesa do bar que todos paravam para escutar alguma história, apreciava muitíssimo essa admiração pública. Imagino que isso somado a sua confiança, autenticidade e independência a tornava uma pessoa muito interessante. Rodrigo deveria pensar o mesmo. Talvez ela não soubesse que estar com pessoas e ter a sua própria rede de contatos era algo tão importante para sua identidade. Primeiro existimos e só depois somos, a existência precede a essência, ser é agir e o agir é sempre social, precisamos do outro para manifestar a nossa essência e parte da essência de Geórgia era ser uma pessoa pública. Na incompreensão de si mesma não mediu os riscos da solidão e não sabia como lidar com ela, toda vez que a solidão a apertava, tentava preencher o buraco com Rodrigo, que jamais conseguiria suprir esse vazio. Com o tempo tornou-se uma sofredora, reclamona e exigente. Rodrigo não aguentou. Daí, vem a culpa. A culpa é quando o projeto original de quem somos não consegue se manifestar no mundo. Quando esse vir-a-ser é, de alguma forma, bloqueado e a essência não consegue se manifestar, sentimos culpa — intensificada pela angústia que a liberdade carrega. Somos livres para ser quem quisermos, mas apenas dentro dos limites das nossas próprias possibilidades. E, ao perceber esses limites, é como se escolhêssemos não ser aquilo que desejamos ser. Isso angustia. Mas o que define essas possibilidades? A nossa consciência. No caso de Geórgia, havia muitas formas dela se tornar quem realmente era e expressar sua essência — só que sua consciência ainda não alcançava essas possibilidades. Na primeira consulta, ela dizia querer ser feliz. Mas, afinal, qual era a razão para que se sentisse feliz? A felicidade é uma escolha? Sim, mas toda escolha exige uma possibilidade real de ser concretizada. E naquele momento, por não compreender as verdadeiras raízes do seu sofrimento, Geórgia não tinha nem essa possibilidade, muito menos a liberdade.
Esses insights sobre o caso me deixaram menos angustiado. Agora eu via alguma luz no fim do túnel. Porém, eu tinha avançado apenas nas minhas percepções, e não na minha relação com Geórgia, ainda precisava caminhar junto com ela para alguma mudança.
Percebi também que parte da obsessão de Geórgia por Rodrigo era porque ele nunca deu a motivação real que o fez ir embora, acredito que não teve a coragem de dizer como ela realmente fazia-o se sentir, então, como a transferência já estava feita, tomei a iniciativa dela receber o feedback de como ela fazia eu me sentir antes que ela começasse em suas lamentações:
Y: Geórgia, hoje iremos fazer diferente, irei compartilhar com você como eu me sinto na nossa relação e gostaria que você me escutasse.
Y: Sinto-me invisível aqui na maior parte do tempo, primeiro decepcionado, e depois frustrado. Tive um grande encanto pela sua personalidade no início, porém existiu uma mudança do seu jeito de ser de uma hora para outra, o que apresentou-se como uma mulher madura, interessante misteriosa virou uma menina mimada, reclamona e pessimista. Na maioria de nossas conversas eu sinto que não existo, o que existe é você e um ciclo de lamentações. Me sinto frustrado com isso porque gostaria de avançar nas nossas conversas, porém parece que não conseguimos sair disso. Isso tudo me deu vontade de parar de dar terapia para você, eu vejo hoje que me sinto como o Rodrigo sentia-se ao seu lado em Portugal, a vontade de ir embora. Porém, não quero fazer isso. Você acha que conseguiu decifrar porque ele tomou essa decisão?
Eu tinha confiado na técnica do Rogers e sido completamente honesto sobre os meus sentimentos, não sabia o resultado que isso traria, porém não vi outro caminho. Ela mostrou-se um pouco chocada com todas as minhas afirmações, ficamos em silêncio por um tempo.
G: Eu não sei direito o motivo, nunca soube, ele nunca me disse. O que arrasa é esse sentimento rasante que ficou com a ida dele.
Y: Esse sentimento foi causado pela ida dele, ou ele sempre esteve aí e o Rodrigo fazia com que ele não estava aparente
G: Eu acho que….. não sei….. ficou mais intenso depois que ele foi embora
Y: Então sempre existiu..
G: Não percebia ele no Brasil, foi mais uma coisa daqui
Y: Ok. Não tenho a certeza se existia antes, mas comecei a perceber esse sentimento em portugal
G: Isso.
Y: Conseguimos nomear esse sentimento?
G: Não tem um nome exato… é como se eu não existisse.
Y: E o que te faria existir?
G: Ser vista, é claro.
Y: E você não era?
G: Não
Silêncio
G: Quer dizer, depois de um dado momento, apenas pelo Rodrigo.
Y: E era suficiente
G: Não, nenhum pouco
Y: Entendo, e o que você fazia com esse sentimento de insuficiência?
G: Nada.. nada verdade eu tentava ser mais vista por ele ainda.
Y: É como se ele estivesse tentando suprir sozinho a força de uma represa.
G: Sim.
Y: Geórgia, você percebe o que é esse ¨ser vista¨que você está me falando? A magnitude disso para o seu processo de identidade? Você sempre foi uma pessoa popular no Brasil, tinha admiração, atenção. Isso faz parte da sua identidade. Um grande medo para pessoas assim é a solidão. Eu tive dificuldade de perceber isso no início porque também é meu maior medo. Fujo até da ideia de me sentir assim em mim, e pelo visto fugi de enxergar em você também.
G: Eu…. eu não tinha parado para pensar, realmente faz sentido. O que mais o culpo não foi pelo fato de me deixar, e sim pelo fato de eu estar sozinha agora.
Y: Por isso seria muito difícil superar, as consequências que foram escolhidas estão presentes no momento e não são apenas uma mágoa do passado.
G: Isso, perfeito
Y: Contudo, você escolhe diariamente continuar sozinha, não existe problema nenhum em ter essa necessidade. Você construiu-se dessa forma. Pode escolher se construir de outra maneira, mas é necessário processar isso antes. Esse peso de não conseguir exercer a sua própria identidade gera o que em você?
G: Uma angústia esmagadora
Foi uma sessão bem intensa e eu estava bem satisfeito com o diálogo, aguardei ansiosamente por Geórgia para continuarmos nosso trabalho na semana seguinte. Ela não atendeu o telefone. Na semana seguinte também não. Ficamos 28 dias sem nos ver.
Certo dia enviou-me uma mensagem dizendo que estava pronta para retornar o processo terapêutico e de certa forma fiquei feliz com aquilo. Quando nos reunimos on-line ela estava visivelmente diferente, ela brilhava. Sua pele estava em um tom diferente, sorria, atendeu a ligação em uma cafeteria bem elegante. Era outra pessoa.
Pediu-me desculpas pela ausência, disse estar passando por um momento introspectivo e que tinha concatenado muitas questões. Mostrava uma maturidade impar dizendo muitas coisas sobre ela em que eu havia pensado. Não só isso, entendeu que precisava se enturmar e tomou inúmeras soluções criativas para isso, matriculou-se em um curso de teatro, aulas de ballet e instalou um aplicativo de relacionamentos, já tinha tido um encontro um homem que considerava bacana e que estava naquela cafeteria porque havia um encontro de amigas do teatro ali após a sessão, conversamos sobre todas essas mudanças e a parabenizei no final da sessão.
Na semana seguinte Geórgia avisou um dia antes que não aparecia mais para a terapia. Havia se dado alta. O motivo? Estava feliz.
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May 28, 2025Categories